segunda-feira, 5 de julho de 2010

Esperança que flui da luta do Povo


É por amor que sonhamos, é por amor que lutamos, é por amor que marchamos em romaria...
Fiz-me romeira com os/as romeiros/as da Diocese de Itabuna, após vários convites e apelos, decidi acompanhá-los em mais uma Romaria da Terra e das Águas, em Bom Jesus da Lapa.
Saímos dia primeiro de julho, á noite com um ônibus e fomos colhendo romeiros pela estrada que corta nossa diocese. Uma viagem alegre de partilha de vida, de farofa, saberes, respeito, atenção e cuidado. Pessoas idosas, adultos, jovens e crianças, um grupo bem diversificado. Alguns pertencentes a movimentos sem terra, indígenas, CPT, CIMI, CEBs e outras pessoas que acompanha e apóiam a luta na região. Senti junto a este grupo um carinho muito grande, ficam alegres por estar caminhando com eles, que escuto os seus gritos, eles me vê como alguém da Igreja que dá atenção a eles, que caminha junto.
Ao chegarmos a Bom Jesus da Lapa, fomos nos organizando enquanto grupo, orientando que foi a primeira vez e nos alojando na Rancharia. Tivemos o dia todo livre para andar, conhecer, rezar, pagar as promessas... tempo para assistir a derrota do Brasil na Copa, tristeza...chororó... mas o consolo veio no dia seguinte, quando os hermanos tomam 4 gol, então voltam de 4 para a Argentina.
Continuamos em nossa Romaria dividindo o grupo para as plenarinhas, cada um recebendo uma fitinha para identificar com os demais participantes. Ao chegar o horário da abertura da 33ª Romaria da Terra e das Águas, fomos para a Praça Cruzeiro de Santa Luzia, nos juntando aos romeiros seguimos para a Esplanada do Santuário onde foi realizada a missa de abertura do evento celebrada pelo bispo da Diocese da Barra, D. Luiz Cappio. Suas sábias palavras encantam e anima o povo. Esta frase proferida por D. Cappio “O amor de Jesus se dirige de modo especial aos pequenos e a visita que fazemos ao Bom Jesus deve ser um compromisso que assumimos de nos mantermos unidos pelas lutas do povo”, me soou como um apelo e um propósito de vida.

Diante daquela multidão que se perguntava “Terra Mãe para onde vamos?” (tema da romaria), era visível o desejo que precisamos mudar, precisamos nos organizar, precisamos somar... vislumbrava-se que um outro mundo é possível.


Pois, vários gritos foram expressos, como dos Moradores de Cabrobó (PE), na região do afluente Pajeú, Ana Maria Callou e Valdenis Brito contaram, de maneira emocionada, a triste experiência que estão vivendo. Valdenis faz parte da comunidade quilombola Jatobá e já começa a perceber problemas sérios nos cultivos de cebola, uma das principais culturas da região. “Antes colhíamos duas safras por ano. Desde que iniciaram as desapropriações de terra, isso não acontece mais.”, lamenta. Morando a três kilômetros do canal da Transposição, Valdenis não acredita que terá acesso a água e lamenta as desapropriações que estão acontecendo. “Será que eles pensam que é só indenizar? Que a casa onde as pessoas moraram não tem valor?” questiona. “Quando a máquina passa pelas nossas casas destrói a nossa vida”, finaliza. Assim fica visível que agora temos os atingidos pela transposição do Rio São Francisco. Outro grito forte citados foi a suspensão das ações e anulação de processos de regularização dos territórios quilombolas e as ações possessórias, pelo poder judiciário. No executivo, a dificuldade reside na morosidade e burocratização dos processos. No legislativo, a bancada ruralista atua na tentativa de retroceder direitos adquiridos.
Outro grito forte foi feito pelos sem terras que destaca uma das principais dificuldades levantadas pelo plenário foi à intensa criminalização dos movimentos sociais pelo judiciário, meios de comunicação e governos executivos e legislativos. Como principais desafios da luta pela Reforma Agrária foram destacados: a necessidade de unificação entre os movimentos do campo e da cidade, a construção de uma educação contextualizada e libertadora e a desconcentração das terras e das águas.
Outro grito apresentado foi à defesa dos biomas Mata Atlântica, Cerrado e Caatinga como Patrimônio Nacional, como estacava a Índia Tupinambá D. Maria “todos precisamos cuidar das nossas matas, não só o índio”. A juventude também soltou o seu grito através do seguinte refrão, “Vamos juntos gritar girar o mundo chega de violência e extermínio de jovens”, frase esta deixada pelo Pe. Gisley a juventude do Brasil. A CEBs também destacou a frase pronunciada por D. Moacyr Grechi no 12º Intereclesial, “Gente simples, fazendo coisas pequenas, em lugares não importantes, conseguem fazer mudanças extraordinárias” e destacou três compromisso: A defesa da vida; Assumir uma nova postura de vida e o Profetísmo. Percebi nestes gritos o desejo de quem quer fazer acontecer o novo, novo modelo econômico que distribua renda e que privilegie os investimentos públicos nas áreas sociais, que combata da desigualdade social, que faça uma reforma agrária e política profunda e radical, que devolva ao povo o direito de decidir e, também, por uma soberania nacional que garanta os interesses do povo brasileiro sobre nossa economia, território, riquezas e biodiversidade. Percebi um povo de fé, que não esmorecem diante das dificuldades, dos desafios, das injustiças, das ameaças, prisões... mas continuam de cabeça erguida. Como dizia a Índia D. Maria “Quem nos vê sorrindo, não sabe o sofrimento que estamos passando”. Podemos nos perguntar mesmo, como está mulher consegue sorri com três filhos e um netinho na prisão? Foram muitos testemunho e lições de vida vivenciadas nestes três dias. Pessoas idosas que participaram da via-sacra, caminharam o longo percurso de mais de duas horas, e estava vibrando no final. D. Miriam do Morro do Chapéu, pulava parecia uma criança, Ivanete, Marieta, Madalena, Nita Reinaldo... Como foi bom encontrar tantas pessoas amigas da diocese de Irecê, e de tantos outros lugares. As nossas irmãs: Santa, Tere, Iria e as noviças que caminha com este povo de Deus. Como diz Sebastiana, “É bom à gente tomar um banho de povo”, de fato na romaria acontece isso mesmo. Como esquecer de D. Maria de Mascote, com 79 anos, firme na luta pela terra, vivem num acampamento, D. Jucélia nossa cantora que animou nossa viagem, Seu Dionísio que foi contando os mata burros da estrada (lombada), D. Lurdes que está presente em todas... Valderlei da CPT que se dedica e organiza para levar os/as trabalhadores/as na romaria.
Posso dizer que uma experiência desta é mais que um retiro, é vivenciar o evangelho encarnado na vida do povo, não dentro de quatro paredes.

Ir.AS. Marisa Ribeiro

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