sexta-feira, 5 de novembro de 2010

Ao ritmo da floresta

Uma estrada de chão com muitos buracos e poeira, nos dá passagem. Atravessando povoados, queimadas, fazendas, mata branca e cocais de babaçu que, mesmo sofrendo a falta da chuva, continuam exuberantes, chegamos até a Terra Indígena Geralda/Toco Preto, do povo Krepum Kateyê.
Chegando à aldeia Sibirino, nos sentimos acolhidas pela tradicional organização circular das casas e pela alegria das/dos indígenas em nos ver. Logo chamaram dona Rosalina, a mais idosa do povo, que sentou-se ao nosso lado. Deram a notícia que nascera mais uma criança na aldeia. É o ciclo natural da vida, a convivência entre as gerações, passado, presente e futuro que se misturam e somam.
Saindo, fomos para a aldeia Geralda. As crianças deram um show de acolhida e presença! Nosso objetivo ali era ver os preparativos para o Encontro com as Mulheres Krepum para estudo da Lei Maria da Penha, que seria no dia seguinte. Numa conversa rápida, percebemos que a comunidade estava desarticulada...
À noite marcamos uma reunião, mas poucas pessoas adultas compareceram. As crianças, mais uma vez mostraram-se muito atentas e participativas, a ponto de fazerem uma pequena análise da situação da aldeia (desinteresse dos adultos em cuidar do coletivo, do ambiente como um todo...). A motivação das mulheres não estava lá estas coisas, mas os homens se prontificaram em pegar peixes para o almoço e ajudar no que fosse preciso para que o encontro pudesse acontecer.
No dia seguinte, a luz do sol e o canto dos pássaros nos despertaram cedo para dar continuidade à missão. As mulheres já estavam de pé, preparando a primeira refeição do dia, os homens já haviam saído para a pesca, a criançada e os jovens já estavam em prontidão para nos ajudar a arrumar o local do encontro. O espaço escolhido foi debaixo das árvores, à beira do rio Grajaú. Ali vivemos um grande mutirão: varrer as folhas, montar bancos de tábuas... água para beber...
Enquanto esperávamos as mulheres cantamos, brincamos com a meninada que volta e meia caiam na água, depois retornavam pulando, numa alegria sem fim! Elas expressavam o interesse que tem em crescer num ambiente sadio, em harmonia com a natureza; expressavam, também, alegria pela nossa presença, que valorizou sua criatividade, espontaneidade, curiosidade. Diante desta realidade que encontramos, percebemos o quanto temos que desconstruir o que programamos e construir a partir do que encontramos.
O tempo foi passando, as mulheres foram chegando... Uma bonita acolhida marcou a todas. Cantamos e ouvimos o relato bíblico do encontro de Maria e Isabel. Nós, mulheres estávamos ali para nos abraçar, nos confortar mutuamente, nos alegrar pela presença de cada uma...
Ao aprofundar a Lei Maria da Penha, as partilhas não foram muitas, mas o suficiente para percebermos que há conflitos, agressões e grande sofrimento na vida daquelas mulheres. As mudanças serão lentas.
Tudo foi acontecendo ao ritmo da floresta, a presença do sol, a chegada das mulheres, a pesca e o preparo do peixe, o envolvimento no tema do encontro...
Por fim, o estilo simples de vida deste povo nos provoca a entender o que há de transcendente, de belo, de renovador ao nosso redor e, assim, nossa vida vai se modelando e sendo construída diária e permanentemente. É um itinerário movido pelo Espírito, que nos questiona, impulsiona, anima e nos faz sair de nós mesmas para nos colocar a serviço da vida.
Estes e tantos outros acontecimentos provocam em nós uma maior adesão à missão que abraçamos, pois vamos descobrindo o sentido de nossa consagração.
Maria Lucélia Araujo da Silva
p/ Irmandade N.Sra. de Guadalupe
Grajaú-MA – 01/11/2010






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